quarta-feira, 29 de julho de 2009

Chico é pop.





Cantor, compositor, dramaturgo, escritor, um pensador até... Certa vez uma amiga minha disse: "Chico Buarque é uma espécie de Aristóteles brasileiro". Brincadeiras hiperbólicas à parte, Buarque saltou do hall de grande gênio pós-Bossa Nova para se tornar esta que, hoje, seja talvez a maior referência intelectual do nosso país. E não é porque é cosmopolita na sua participação no meio artístico - até porque, musicalmente, Chico é um revisor da tradição, o extremo oposto de um Caetano Veloso, por exemplo, que se reinventa constantemente, sempre na busca pelo novo. Mas Chico é algo interessante de se analisar... Além de todas as suas atribuições e contribuições para a história cultural do Brasil recente ele é... Bonito (?!). Sim, é um galã para muitas, "o Felipe Dylon das quarentonas", como ironizou certa feita Juremir Machado da Silva.

Fato é que a passagem de Chico Buarque pela Festa Literária Internacional de Paraty justifica sua colocação no Olimpo das letras nacionais. Nessa cidade da literatura, ele é o rei! Sua presença é um evento! Numa era tão sem referências como a nossa, o exemplo de Buarque faz pensar como os mitos são criados em nossa sociedade: sua genialidade ultrapassa os limites da razão, pois consegue, mesmo numa tão recente e curta incursão pelo romance, criar obras magníficas, de notável apuro estético e narrativo, em que uma consegue reverter expectativas da anterior, promovendo algo sempre original (até mesmo se comparadas com seu papel na canção). E estamos falando do homem que compôs obras-primas irretocáveis como "Construção", "Folhetim", "Eu te amo" e tantas outras; que participou da renovação do teatro brasileiro com Gota D'água e Calabar e que, simplesmente, tornou-se uma referência de embate com a repressão durante a ditadura militar na luta pela liberdade de expressão. Com esse currículo, já temos a receita para se fazer um herói dentro da cultura. Mas o homem não cansa e dedica-se também à literatura, justamente em um gênero hoje pouco produzido, pelo esmero necessário à sua criação, e pouco lido, pelas inúmeras atrações que rivalizam com ele nesse espetáculo da modernidade: o romance. Nesse sentido, Chico reinventa sua carreira à sua maneira. E lá vão mais genialidades: Estorvo, Benjamin... E o cara ainda é best-seller (!).

O sucesso comercial de Chico Buarque, principalmente em seu último livro, Leite Derramado, obviamente se deve a um excelente movimento de promoção editorial, mas não há dúvida de seu talento. Só isso justifica a mobilização que ele produz num evento desse tipo: os ingressos para a mesa de discussão em que ele participaria esgotaram-se em poucas horas, um mês antes da FLIP iniciar. A mera ideia da presença do compositor causa histeria em fãs que, dadas as suas feições de mães e pais de família, parecem patéticos, mas a idolatria é como a fé, e esses são elementos absurdamente irracionais. Posso estar errado, mas acredito que Chico nunca foi tão unânime quanto hoje; seu sucesso nunca foi tão presente quanto hoje; talvez ele mesmo só esteja vendo seu sucesso comercial, realmente, hoje, justamente porque necessitamos de referências como ele, tão precisamente geniais, tão idôneas.

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Na noite do dia 3 de Julho, temos um circo armado. Uma sala: lotada; um espaço para ver a tal mesa de debate no telão: lotado; o mediador da mesa avisa que os autores autografarão seus livros em seguida, em quatidade limitada: histeria, corre-corre... Uma fila de autógrafos cheia, lotada, antes mesmo de iniciarem-se os trabalhos. Analiso o contexto e penso: "Milton Hatoum... Ele é o outro cara da mesa do Chico... Apenas isso: aqui ele é o outro cara. Será que ele se dá conta disso? Putz, ele escreveu Dois Irmãos, uma obra-prima... Será que alguém está aqui para ouvir ele? Será que alguém vai autografar algum livro seu também...?".

Trata-se de um testemunho: testemunhamos a afirmação de um ídolo. Tão grande quanto Michael Jackson, tão distinto e reverenciado quanto Madonna, tão permanente quanto Beatles, U2 e Rolling Stones. Lá, em Paraty, na terra dos livros, Chico Buarque é pop - é o rei do pop! (Aposto que se ele andasse caminhando pelo calçadão de Copacabana nem seria notado.)

Ah! Quanto aos autógrafos, não fiquei para ver, mas parece que Buarque só autografou 150 livros, a histeria causada em torno de sua presença atrasou o show de Francis Hime & Olivia Hime, o que me deixou um pouco irritado. Espero que Milton Hatoum tenha autografado algum livro, mesmo que tenha sido uma dedicatória em algum exemplar de Leite Derramado - toda essa catarse social tornou o cara um pouco mais simpático para mim.

terça-feira, 21 de julho de 2009

"É uma festa, não um evento acadêmico."

A frase acima define muito bem a diferença que se coloca entre a FLIP e demais eventos que buscam essa necessidade de colocar em pauta a literatura. Trata-se, literalmente, de uma festa, como o próprio nome que ela leva já diz (Festa Literária Internacional de Paraty). Mas até que ponto uma festa pode contribuir para uma discussão literária? Essa é a grande questão, pois, afinal, não existe forma melhor ou pior de discutir a literatura e, o aspecto mais importante, discutir o corpus literário, não é, afinal, mais ou menos importante do que, efetivamente, ler.

As palavras do conferencista de abertura do evento Davi Arriguci Jr. ilustraram muito bem do que se trata a FLIP e, logo no primeiro dia, tornou-se muito nítido o que tínhamos ali: na principal praça da cidade, uma biblioteca infantil gabaritada, livros pendurados nas árvores, autores famosos circulando pelas ruas, cordelistas recitando seus versos, uma infinidade de palestras gratuitas acontecendo ininterruptamente, projetos dos mais variados divulgando seus trabalhos em vários estandes... Enfim, o que diz Arriguci: "um evento que valoriza a necessidade da leitura". Parece uma frase simples, mas perceba a sutileza: o crítico e professor, em suas palavras (e como dito posteriormente), coloca que se trata de uma necessidade que se sobrepõe, inclusive, ao ato de escrever, é algo muito maior do que essa ligação intríseca entre escrita/leitura; ler é um ato solitário, sim, pois nos vinculamos intimamente com um livro, mas, da mesma forma, ler é um ato isolado, que fala por si só e que deve ser valorizado no e pelo momento da leitura. Discutir um livro, um autor e sua obra é algo fundamental, mas tornar o ato de ler algo tão natural quanto assistir TV ou ouvir música (também um lazer, portanto) é uma missão da FLIP e que deve não estar tão engessado em objetivos, expectativas ou cotejos com a teroria e a crítica.

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Para aquele que chega em Paraty, fica nítido que tal evento está no lugar certo: uma cidade que respira o século XVIII em suas construções, em que seu centro histórico compreende quase que todo o seu território, os livros descansam e a leitura está permanentemente viva entre as pessoas como um ideal perdido no tempo. Claro, há elementos de profunda relação mercadológica, uma vez que temos as falas dos autores "popstars" que, digamos, "puxam" o público para a cidade e promovem o turismo realmente - o turista que paga caro, que consome não só cultura -, mas, ao contrário das minhas próprias expectativas, não é um evento tão elitizado como esperava (o que por muitas vezes plantou uma séria dúvida sobre a validade de investir no mesmo); o espaço infanto-juvenil é extremamente valorizado, uma alegria só ver as escolas, as crianças e os adolescentes envolvidos em atividades simples, mas que fazem toda a diferença e, principalmente, um evento democrático por equilibrar a necessidade de custeá-lo (refiro-me às palestras pagas em que, não sendo estudante, fica realmente caro ir à FLIP), associado também a uma programação aberta a todos (e aqui tenho a convicção de afirmar que se trata do "grosso" do evento).

Para quem é de Porto Alegre, há uma relação muito próxima com a forma como a Feira do Livro estruturou-se nos últimos anos, abrindo espaço para palestras e oficinas, por exemplo - exceto pelo fato de que a venda de livros não é o foco em Paraty. Essa proximidade dá-se, fundamentalmente, por essa relação que há com a euforia pelo livro, uma euforia perdida com o advento de tecnologias e chamarizes que diminuíram o público leitor nessa nova sociedade pós-moderna. Neste sentido, é nítido o esforço da Festa Literária de Paraty em agradar as crianças (e agora com foco também nos adolescentes), pois nelas reside a esperança de termos leitores que manterão aceso o gosto pela literatura em todas as suas formas (na oralidade também!) e, sejamos honestos, é isso realmente o que importa, afinal de contas é uma festa, e ninguém sabe fazer festa melhor que eles.

quarta-feira, 8 de julho de 2009

Festa Literária Internacional de Paraty

Então, pessoas...

De volta à capital gaúcha, após a FLIP 2009 em Paraty! Por ora só podemos dizer que há muito a ser contado. A ideia é, gradualmente, atualizar o Devaneio Literário com alguns dos principais momentos que presenciamos neste evento incrível.

Em meio a histórias em quadrinhos, furor por Chico Buarque, palestra com o Marcelo Tás (do CQC) e até aparição na TV, muitas coisas legais serão aqui relatadas.

Aguardem!